sábado, 30 de abril de 2011

154. Sol

Uma vez ela chegou e disse: "você é um sol".

Não é algo que se ouve na nossa língua - é comum na língua dela. Eu lhe havia dado um presente e estava morrendo de vergonha e medo de que não houvesse gostado, ou que estivesse dizendo que gostou para ser educada. A gente não se conhecia bem naquela época, e não sei o quê me fez esquecer da maioria das cautelas sociais que tenho e dar-lhe um presente grande. Um presente grande demais pra uma pessoa que eu conhecia havia poucos meses.

Dei um passo no escuro, e tinha medo de cair. Ou melhor, de que ela me empurrasse na escuridão e eu caísse. De que um ato de afeto genuíno, de que um pedido de amizade destrambelhado, se tornasse apenas uma idiotice que fiz por amor. Mais uma idiotice que fiz por amor e que nunca mais havia encontrado motivo para repetir em muito tempo.

Porque, claro - todo mundo tem medo no início. Eu não queria ter medo. Mas ela talvez tivesse. E nosso mistério é o outro, e até hoje eu ando apreensiva - será que deveria ter feito isso? Será que ele vai gostar disso? Eu sou assim comigo, mas não o serei com você - com medo de perder o pouco que tenho. Mais que corpo, coração. E eu tateava no escuro, como sempre, porque levantar as máscaras é sempre muito, muito arriscado.

Mas ela disse que eu era um sol. E como um sol eu brilhei. E o caminho iluminado já não me assustava tanto assim. Não vi final, não vi sequer o próximo passo, mas pelo menos percebi que ele segue - adiante, adiante, até o infinito, seja lá onde isso seja.

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